quarta-feira, 22 de agosto de 2007

O último mês das férias de verão estavam se alastrando com uma velocidade incrível. O que deveria ser só um mês de permanência na casa dos Neitchez, se tornou as férias inteiras. Maggie e Leví insistiram para que eu e Ricard ficássemos, e nós aceitamos de imediato. Nenhum dos dois tinha a mínima vontade de voltar para casa...

Estávamos todos sentados na mesa do café da manhã, quando três corujas marrons entraram pela janela e pararam em frente a mim, Victor e Ricard. Meu estômago deu uma volta completa e afastei o mingau de aveia, perdendo completamente o apetite. Victor e Ricard também encaravam os envelopes, ainda sem abrí-los.

KN: Acabem logo isso! Vocês já fizeram os NOM’s, não podem mudar os resultados agora. – Karl disse impaciente. Ricard foi o primeiro a tomar atitude e abrir o envelope. Deu uma olhada no resultado e sorriu.
RD: Nada mal. Tirei “A” em Alquimia, mas não esperava nada melhor do que isso...

Victor respirou fundo e abriu o envelope em suas mãos, puxando seus próprios resultados.

VN: Não fui tão bem. “A” em Alquimia e Herbologia. “E” em Trato das Criaturas Mágicas, e “O” nos outros.
CN: Nada mal, Vi! – Christine falou sorrindo. Minhas mãos tremiam.
RD: Abre logo isso, Vínia! –Ricard disse impaciente.

Abri. Na mesma hora, três cartas caíram na mesa. Peguei a última. Em um minuto, senti uma sensação de alívio que nunca havia sentido antes. Tão forte, boa. Tirando o “E” em Adivinhação, havia atingido “O” em todas as outras matérias. Tinha saído muito bem, tão bem que foi impossível não soltar um sorriso de alívio.

LD: Consegui! Vou poder continuar em todas as matérias!
RD: Grande novidade... – Ricard disse rindo e apanhando uma torrada.
MN: Parabéns querida. Ótimos resultados. – Maggie falou depois de passar os olhos pelo pergaminho.

Só depois de ler mais cinco vezes os resultados, me lembrei das outras duas cartas. Abri a mais grossa e sem nenhuma surpresa, estava a lista de livros para Durmstrang. Corri os olhos por elas, até que um deles me chamou atenção.

LD: Defendendo-se das Trevas. “Um guia avançado de Defesa contra as Artes das Trevas”. – li em voz alta arregalando os olhos. – Como assim, “defesa contra as artes das trevas”???

Ricard e Victor também olhavam assombrados para suas próprias listas. Parecia ter alguma coisa muito errada com elas.

MN: É, tivemos que fazer uma grande encomenda desses livros esse ano. Durmstrang passou a adotá-lo para todas as séries.
VN: Não faz o menor sentido! Quer dizer, faz. Eles devem estar pensando em nos ensinar a atacar uma defesa metódica.
RD: Não sei o que eles estão pensando em fazer, mas que isso está estranho, está! – Ricard concluiu fechando o envelope. – O que é essa outra aí, Lavínia?

Apanhei a última carta. Era bem menor, e escrita em uma caligrafia minúscula e bastante difícil de decifrar.

“Cara Srta. Durigan,

De acordo com seu desempenho nas aulas de Herbologia, e seu resultado nos NOM’s, venho por meio dessa anunciar que você é minha convidada para liderar o Clube de Botânica e Herbologia, esse ano. Caso haja alguma objeção, favor me comunicar o mais breve possível.

Agradecendo desde já,


Mikhail Kalashnikov
Diretor da Ansuz e Professor de Herbologia.”

Arregalei os olhos com a surpresa. Nunca esperava ser chamada para liderar o grupo de Herbologia. Participava dele desde o ano passado, mas ser líder? Minha cabeça deu um giro completo. Ricard puxou o pergaminho da minha mão e leu para todos.

VN: Uau, parabéns! – Victor me deu um beijo. – Você conseguiu três proezas: Receber uma carta do Professor Mikhail, decifrar os garranchos dele e ser chamada para comandar um clube!

Todos riram, mas senti a boca apertar. Eu queria mesmo aceitar, mas não saberia como agir, como liderar todas aquelas pessoas. Estava perdida em pensamentos quando um estalo se ouviu no quintal. Foi instantâneo. Todos apanharam as varinhas, apontando para a direção do barulho. Mas assim que vi pela janela quem vinha caminhando em nossa direção, meu queixo caiu e abaixei a varinha a tempo da pessoa bater na porta. Leví já ia perguntar quem era, mas me levantei adiantando.

LD: Tudo bem, Sr. Neitchez. É meu irmão.
LN: Ah. Certo. – concordou confuso, abrindo a porta. Vlade olhou de um para outro e então sorriu me dando um abraço.
SV: Já que você decidiu se ver livre de mim dois meses seguidos, vim te ver. Como você está?
LD: Estou bem. Esses são Leví e Maggie. Karl, Christine, Charlotte e Gabrielle. Você conhece os outros dois, certo? – apontei para cada um na mesa. Depois disse para os outros. – Esse é meu irmão, Steven.

Ele acenou com a cabeça. Ficou parado na porta olhando para cada um deles. Maggie se levantou conjurando mais uma cadeira, prato e talheres à mesa.

MN: Entre, por favor. Estávamos acabando de tomar café da manhã!

Vlade se sentou parecendo pouco à vontade. Conhecia-o bem demais para saber o quanto ele era anti-social. Me senti em um filme surrealista, onde várias coisas estranhas acontecem ao mesmo tempo. Uma hora antes eu estava me vestindo para descer, e agora eu já tinha recebido o resultado dos NOM’s, me intrigado sobre o livro de Defesa Contra as Artes das Trevas, sido convidada para ser monitora do clube de Herbologia e a pessoa menos provável de aparecer na casa de Victor para me procurar, estava nesse exato momento, sentado do meu lado.

LN: Lavínia nos falou sobre você. Auror não é? – Leví perguntou educadamente e Vlade confirmou. – Sua irmã saiu muito bem nos NOM’s. Até foi chamada para ser monitora do Clube de Herbologia de Durmstrang. Victor tem muita sorte em ter alguém como ela...

Por um momento quis desaparecer embaixo da mesa. Vlade se abrumou na cadeira e eu sabia o que ele estava pensando. Não deu outra.

SV: É, minha irmã é bastante inteligente.

E foi só isso que ele disse. Passou o resto do café da manhã conversando com os outros, e quando a mesa foi retirada ele segurou meu braço e disse baixo para ir conversar com ele no jardim. Caminhamos em silêncio até a porta da estufa.

SV: Então. Tudo bem?
LD: Sinceramente? Estava, até antes de você chegar. O que está fazendo aqui?
SV: Já disse. Vim te ver. Você pode não acreditar, Lavínia, mas eu gosto de você como se fosse minha irmã por completo. Quando soube que não ia para casa, vim. E não vai me dizer que você ainda está com raiva de mim, não é?
LD: Para você é fácil esquecer as coisas. Não esqueci. Nunca vou te perdoar por ter procurado o professor Nicolai antes do meu teste vocacional. Foi sujo, baixo, idiota demais! – soltei irritada.
SV: AH Lavínia, quantas vezes vou ter que te falar que só quero o seu melhor?!
LD: Fale quantas vezes quiser. Mas se quer mesmo o meu melhor, faz um favor pra mim? Para de se meter na minha vida! Eu estudei e ainda vou estudar muito para conseguir o que quero. Não preciso de você escolhendo o que é ou não, bom para mim, entendeu?
SV: Não vou mais atrapalhar em nada. Você sabe o que faz. Já vi que minha idéia de vir até aqui foi infeliz, então vou embora. Acho que não vou voltar para Durmstrang esse ano. Pedi transferência. Então a gente se vê...
LD: É, a gente se vê.

Ele desapareceu com um estalo e me deixou sozinha e pensativa.

°°°

Nos sentamos em um banco na praça principal de Arbanasi. Batia um vento fresco de fim de tarde, e estávamos bem cansados de caminhar. Passamos a tarde toda comprando livros, penas, ingredientes de poções, pergaminhos e tinteiros... Com os pés abarrotados de sacolas pesadas, apenas nos largamos no banco, cada um com um copo de chocolate quente na mão. Ficamos em silêncio um minuto, até Victor perguntar o que estava martelando na minha cabeça.

VN: Você vai ou não aceitar a proposta do Mikhail?
LD: Não sei.
RD: Como assim, não sabe? Quantas vezes você me disse para tentar uma vaga no clube, por que era muito bom, muito produtivo, etc. Agora que você tem a chance de guiar da sua maneira, você está pensando em recusar???
LD: Não tenho didática nenhuma, Ricard. Não sei liderar.
RD: Lavínia, PELAS BARBAS DE MERLIN! Os alunos do clube são selecionados a dedo! Você não vai precisar ensinar nada! Eles são tão bons quanto você! Você só vai precisar guiar eles. Comandar o que vai ser feito, e quando vai ser feito. COMO vai ser feito eles devem saber muito bem.

Ricard parou de falar. E era sempre assim. Eu tinha uma dúvida e Ricard a matava com vários tiros certeiros. Como se a resposta sempre fosse óbvia. É claro que eu iria aceitar. É claro que os outros alunos eram bons em Herbologia.

LD: Você tem razão. Vou aceitar.
VN: Isso aí. Tenho certeza que se o Professor Mikhail te escolheu entre outros tantos, é por que ele sabe que você vai conseguir.
RD: Bom, resolvido o dilema? Vou ao correio despachar uma carta aos meus tios dando notícias. Depois vou voltar para casa. Vocês estão indo agora?
VN: Daqui a pouco vamos. Só quero mostrar um lugar para a Lavínia antes. Nos encontramos lá.

Ricard apanhou as sacolas dele e saiu descendo a rua para os correios. Victor se levantou apanhando o restante das sacolas e pedindo para que o seguisse. Subimos a mesma rua, até o final, e quando minhas pernas já começavam a reclamar, ele parou. No alto da ladeira, agora no começo da noite, dava para ver Veliko Tarnovo ao longe. Vários pontos luminosos brilhando. Victor largou as sacolas no chão e me abraçou.

VN: Agora você já conhece meus dois lugares favoritos. A sala do aquário e aqui.
LD: É lindo. – respirei fundo. Tirei da cabeça todos os problemas por uns minutos. Beijei Victor devagar. – Eu te amo.

Ele travou por um momento. Parecia não saber o que dizer. Na verdade, nem eu sabia. Foi muito instantâneo, mas depois que disse, me senti bem mais leve. Inacreditavelmente leve, como se aquilo estivesse engasgado há muito tempo. Victor ainda me encarava sem reação.

LD: Se eu soubesse que você agiria assim, nunca teria dito!
VN: Desculpa. É a primeira vez que você fala isso.
LD: Eu sei.

Estava tentando parecer casual. Victor ainda me olhava assustado, mas depois de uns segundos riu e me abraçou com força.

VN: Eu prometo que eu nunca vou deixar você.
LD: Não promete isso. Não promete nada. Vamos só deixar acontecer, ok?

Ele me encarou sério e eu percebi que mesmo que eu não estivesse levando a promessa dele a sério, ele estava. Abracei ele de novo e ficamos calados observando a noite cair. Alguma coisa me dizia que o novo ano em Durmstrang mudaria minha vida, de alguma maneira...

Staring at the blank page before you
Open up the dirty window
Let the sun illuminate the words that you could not find
Reaching for something in the distance
So close you can almost taste it
Release your inhibition

Feel the rain on your skin
No one else can feel it for you
Only you can let it in
No one else, no one else
Can speak the words on your lips
Drench yourself in words unspoken
Live your life with arms wide open
Today is when your book begins
The rest is still unwritten

Natasha Bedingfield – Unwritten

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